Relator: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Órgão julgador: Turma, julgado em 27/5/2024, DJe de 29/5/2024).
Data do julgamento: 12 de novembro de 2025
Ementa
RECURSO – Documento:6788685 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 0000634-44.2019.8.24.0015/SC RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR RELATÓRIO PLANEJA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA - ME interpôs apelação contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Canoinhas que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c indenização por dano moral e perdas e danos ajuizada por B. A. L. C., julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos: Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos de B. A. L. C. contra Planeja Empreendimentos Imobiliários, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para:
(TJSC; Processo nº 0000634-44.2019.8.24.0015; Recurso: recurso; Relator: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR; Órgão julgador: Turma, julgado em 27/5/2024, DJe de 29/5/2024).; Data do Julgamento: 12 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6788685 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0000634-44.2019.8.24.0015/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
RELATÓRIO
PLANEJA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA - ME interpôs apelação contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Canoinhas que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c indenização por dano moral e perdas e danos ajuizada por B. A. L. C., julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos:
Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos de B. A. L. C. contra Planeja Empreendimentos Imobiliários, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para:
a) declarar a resolução do contrato de compra e venda firmado entre as partes e, via de consequência, determinar o retorno das partes ao status quo ante;
b) condenar a ré à restituição dos valores pagos pela parte autora, a ser calculado em cumprimento de sentença, corrigidos e acrescidos de juros moratórios nos termos da fundamentação;
c) condenar a ré ao pagamento, em favor da autora, da multa prevista no contrato de compra e venda, na forma da fundamentação;
d) condenar a ré ao pagamento dos danos materiais, em montante a ser apurado em liquidação de sentença, na forma da fundamentação; e,
e) condenar a ré ao pagamento de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de danos morais, corrigidos e acrescidos de juros moratórios, nos termos da fundamentação.
Condeno a ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos moldes do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (evento 149, SENT1).
Sustentou, em síntese: a) que os vícios construtivos são superficiais e passíveis de reparação, não justificando a rescisão do contrato e, subsidiariamente, requereu a fixação de taxa de ocupação do imóvel a fim de evitar enriquecimento ilícito da parte apelada; b) que a aplicação da cláusula penal é indevida, pois foi estipulada em favor da CEF; e c) que a condenação por danos materiais é genérica. Defendeu o afastamento da condenação ao pagamento de indenização por danos morais e, subsidiariamente, a redução do quantum fixado (evento 156, APELAÇÃO1).
Contrarrazões no evento 163, CONTRAZAP1.
É o relatório.
VOTO
1 – Admissibilidade
1.1 – Não será analisado o pedido subsidiário no sentido de fixação de taxa de ocupação do imóvel pelo período de fruição do bem, uma vez que não foi objeto da contestação, tampouco analisado pela sentença e, desta forma, está caracterizada a inovação recursal que impede seu exame por esse Tribunal, sob pena de supressão de instância.
A propósito, este Tribunal já decidiu que "a matéria relativa à cobrança da taxa de fruição não constitui questão de ordem pública ou superveniente, razão pela qual não pode ser analisada de ofício" (TJSC, Apelação n. 5006900-83.2020.8.24.0028, do , rel. Yhon Tostes, Segunda Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 18-09-2025).
1.2 – No mais, o recurso deve ser conhecido, uma vez que tempestivo e presentes os demais requisitos de admissibilidade.
2 – Mérito
2.1 – Do vício oculto
A parte apelante insurge-se contra a sentença que reconheceu a rescisão contratual, alegando que os vícios apontados são meramente superficiais e passíveis de reparação, razão pela qual sustenta ser desproporcional a resolução do contrato, devendo prevalecer o princípio da conservação, com a mera correção dos defeitos.
Sem razão.
Inicialmente, ressalta-se ser cogente a aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor.
Em relação ao vício oculto, dispõe o artigo 18 do CDC:
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
[...]
§ 6° São impróprios ao uso e consumo:
[...]
II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;
III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam.
De forma semelhante, quanto aos serviços, dispõe o artigo 20:
Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.
§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade. (sem sublinhas no original)
No caso dos autos, verifica-se ser incontroversa a existência de vícios, conforme alegado e corroborado pela prova pericial. A parte apelante busca reduzir a gravidade dos vícios, argumentando que seriam superficiais e que a rescisão do contrato seria desproporcional, pois bastava o conserto.
Contudo, da análise das provas produzidas, verifica-se que os referidos vícios – como rachaduras, infiltrações e problemas na fiação – não foram sanados de forma definitiva, persistindo mesmo após as tentativas de reparo da construtora.
Depreende-se do laudo pericial (evento 68, LAUDO1):
QUESITO 02: As avarias citadas no laudo (Evento 1 LAUDO / 151 a LAUDO 168) foram sanadas a contento?
RESPOSTA: Não foram sanadas, novas fissuras surgiram demonstrando que o problema não foi sanado a contento.
QUESITO 05: As eventuais avarias podem ter sido provocadas ou agravadas pela ausência de manutenção no imóvel?
RESPOSTA: Não.
QUESITO 06: As eventuais avarias podem ter sido provocadas ou agravadas voluntariamente pelo usuário?
RESPOSTA: Não.
Descrição: Cabos elétricos soltos, podendo gerar um possível incêndio. Classificação da Anomalia - Endógena; Classificação da Falha - Execução; Risco - Elevado.
[...]
E da conclusão do referido laudo, extrai-se:
A edificação avaliada não atende a finalidade, devido às manifestações descritas abaixo:
• Existem pontos de infiltração;
• Cerca de 90% dos azulejos do banheiro encontram-se com som cavo (oco);
• Foi identificado fissuras horizontais e diagonais em torno da porta da sala devido a presença de sobrecarga vertical.
• Foi identificado fissuras horizontais e diagonais em torno das janelas devido a presença de sobrecarga vertical e também indícios de infiltração permitindo a passagem de água resultando na formação de manchas devido a ação de microrganismos.
• Pingadeiras obstruídas com massa, não permitindo a passagem de água pelo corte da pingadeira, ocasionando infiltração em torno da janela.
• Falha nas vedações das esquadrias, resultando na entrada de umidade na parte interna, desrespeitando a norma técnica.
• Cerca de 95% dos azulejos acima da pia da cozinha encontram-se com som cavo (oco).
• Cerca de 40% dos azulejos da área de serviços encontram-se com som cavo (oco)
• Deficiência no acabamento das caixinhas elétricas;
• Falha no rejunte dos azulejos do banheiro;
• Rebaixamento da calçada proporcionando a entrada de água e gerando infiltração; Sendo assim,
A edificação avaliada NÃO ATENDE A FINALIDADE, lembrando que a mesma deveria atender o período de vida útil estabelecido pela NBR 15575. Entretanto os vícios apresentados podem e devem ser saneados. (sem destaque no original)
A propósito, vale destacar trecho da sentença que se adota como razão de decidir (Tema 1306/STJ):
Como se pode verificar, a constatação do primeiro laudo (o de origem) não destoa no todo do laudo realizado pelo expert deste Juízo, demonstrando que os problemas identificados voltaram a aparecer, mas agora com maior intensidade e sinalizando o emprego de material de má qualidade e má execução na construção como os causadores do defeitos.
Além disso, as testemunhas que foram ouvidas em Juízo confirmaram que a parte autora, já no mesmo ano de aquisição do imóvel, em 2013, verificou que o imóvel apresentou vários e similares problemas identificados nos laudos, os quais, a despeito de reparos realizados pela parte ré, não foram resolvidos, nem mesmo o seriam em razão de problemas estruturais existentes de difícil solução, de modo que a simples realização de reparos não é medida suficiente para sanar os vícios crônicos no bem.
Por outro lado, a parte ré não produziu nenhuma prova apta a afastar o laudo pericial e as demais provas produzidas, as quais demonstram que houve descumprimento contratual no que se refere às avarias encontradas no bem, o que deveria tê-lo feito, em observância à inversão do ônus da prova deferida (evento 1, DESP307; evento 1, DESP308; evento 1, DESP309 evento 1, DESP310 evento 1, DESP311) (evento 149, SENT1).
Assim, independentemente da norma ABNT vigente ao tempo da construção e ainda que não existam propriamente problemas estruturais, é inegável a existência de vícios que comprometem a habitabilidade, sobretudo em se tratando da compra de imóvel novo que se espera, se não perfeito, ao menos sem defeitos que causem graves problemas de infiltração (que são nocivos à saúde). É inegável a ineficácia dos reparos, motivo pelo qual a manutenção da sentença é medida que se impõe, garantindo-se a proteção do consumidor e a eficácia da norma consumerista.
Note-se que, ao contrário do que defende o apelante, o CDC não concede ao fornecedor a possibilidade de promover os reparos e, somente se descumprida a medida, a conversão em perdas e danos; o código é claro em dizer que a restituição imediata da quantia paga é alternativa à escolha do consumidor.
Já decidiu este , rel. Haidée Denise Grin, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 16-11-2023).
APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS E DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL CELEBRADO COM CONSTRUTORA, CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. IMÓVEL COM VÍCIOS QUE O TORNAM IMPRÓPRIO OU INADEQUADO PARA SERVIR DE RESIDÊNCIA A SEPTUAGENÁRIA. VÍCIOS CONHECIDOS PELA CONSTRUTORA MAS NÃO SANADOS OPORTUNAMENTE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA DEMANDADA.
SUSCITADA A INAPLICABILIDADE DO ART. 18 DO CDC, AO ARGUMENTO DE QUE NÃO SE PODE QUALIFICAR DE IMPRÓPRIO OU INADEQUADO AO USO BEM QUE PODE SER REPARADO RAPIDAMENTE E COM POUCO GRAU DE DIFICULDADE, CONFORME ATESTADO EM PERÍCIA. INACOLHIMENTO. PERITO QUE TAXATIVAMENTE DESTACOU A INADEQUAÇÃO E INSALUBRIDADE DO IMÓVEL. EXISTÊNCIA DE DIVERSOS PONTOS DE INFILTRAÇÃO, DE ERROS DE VEDAÇÃO E DE CAIMENTO, CAUSANDO RACHADURAS EM TETO, PAREDES E RODAPÉS, ALÉM DE BOLOR, COM RISCO DE ACIDENTES ELÉTRICOS E QUEDA DE DETRITOS. VÍCIOS QUE, ADEMAIS, DE FATO NÃO FORAM SANADOS NO PRAZO DE TRINTA DIAS PREVISTO NO ART. 18, § 1º, DO CDC. [...] AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUALQUER RUPTURA DA BOA-FÉ PELA CONSUMIDORA. ADEMAIS, TOLERÂNCIA DA AUTORA EMBASADA NA EXPECTATIVA INSPIRADA PELA CONSTRUTORA REQUERIDA DE QUE OS VÍCIOS SERIAM EFETIVAMENTE SANADOS, O QUE A DEMANDADA SE DEMONSTROU INCAPAZ DE CUMPRIR (TJSC, Apelação n. 0309436-02.2017.8.24.0023, do , rel. André Carvalho, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 29-03-2022) (sem destaque no original).
Rejeita-se o recurso.
2.2 – Danos materiais
A parte apelante sustenta que a autora não comprovou os prejuízos alegados, afirmando que não teria demonstrado os fatos constitutivos de seu direito, nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil. Alega, ainda, que a sentença a condenou de forma genérica, relegando sua quantificação para a fase de liquidação.
A parte apelada, por sua vez, sustenta a ausência de impugnação específica por parte da apelante com relação aos danos materiais alegados e demonstrados nos autos.
Adianta-se, razão assiste à parte apelante.
Como cediço, em geral, a configuração do dever de indenizar pressupõe quatro requisitos: uma conduta ilícita; um dano; um nexo causal entre eles e a existência de culpa do ofensor, na forma dos artigos 186 e 927 do Código Civil.
No caso dos autos, embora a sentença tenha reconhecido a existência de danos materiais decorrentes das tentativas de reparo dos vícios construtivos no imóvel, a exemplo de alegada destruição da jardinagem, necessidade de desocupação temporária do imóvel, a parte apelante não logrou êxito na respectiva comprovação.
Com efeito, ainda que constem orçamentos que instruíram a petição inicial, tais documentos não guardam relação temporal ou material com os supostos vícios construtivos. Comprovam, por exemplo, que a edificação foi concluída em 2012 (evento 1, INF35), mas os orçamentos referentes a balcão e armário multiuso, constantes nos evento 1, INF186 e evento 1, INF187, datam de abril e fevereiro de 2014, respectivamente, sem que tenha sido demonstrado que tais gastos decorreram de danos atribuíveis à parte apelante. Situação similar ocorre em relação ao orçamento de paisagismo (evento 1, INF188), datado de agosto de 2013, não sendo possível estabelecer relação direta com os supostos problemas no jardim narrados, que teriam surgido apenas em janeiro de 2014 (evento 1, PET6). Do mesmo modo, verifica-se em relação à nota fiscal constante no evento 1, INF196, que não possui qualquer indicação expressa de vínculo com os danos alegados.
Deste modo, não se pode presumir o nexo de causalidade entre os gastos apontados e os suspostos danos decorrentes dos trabalhos realizados pela parte apelante, o que inviabiliza o deferimento do pleito indenizatório por danos materiais. Ressalte-se que, em demandas de tal natureza, o ônus probatório da autora não se restringe a demonstrar a existência dos danos, mas também a comprovar que estes decorreram diretamente da conduta atribuída à parte ré, nos termos do art. 373, I, CPC. Não sendo comprovado o nexo causal, inexiste responsabilidade civil.
Assim, ante a ausência de comprovação do nexo de causalidade entre os prejuízos alegados e os vícios apontados, impõe-se o reconhecimento da improcedência do pedido de indenização por danos materiais, por falta de prova mínima dos pressupostos essenciais à responsabilização civil.
Mutatis mutandis, já decidiu este , rel. Helio David Vieira Figueira dos Santos, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 29-09-2022)
O recurso merece provimento neste ponto.
2.3 – Da cláusula penal invertida
A recorrente insurge-se contra a sentença que a condenou ao pagamento da multa contratual, sob a alegação de que a penalidade é incabível, pois foi prevista em benefício da Caixa Econômica Federal (CEF), que não integra a relação processual.
Razão lhe assiste.
A jurisprudência do Superior , rel. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 27-02-2024) (sem destaque no original).
Assim, depreende-se que os danos morais restaram devidamente configurados, daí porque inafastável a condenação à indenização respectiva.
2.3.2 – Quantum fixado
A parte apelante, subsidiariamente, postula a redução do quantum fixado na sentença (R$ 15.000,00).
Assiste-lhe razão, adianta-se.
Sobre as balizas para o arbitramento da indenização do dano moral, cabe transcrever lição de Sérgio Cavalieri Filho:
[...] o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes.(CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 16. ed. Barueri: Atlas, 2023, ebook).
Segundo a jurisprudência do Superior :
Convém destacar que a indenização mede-se pela extensão do dano, nos termos do artigo 944 do Código Civil.
Contudo, sabe-se que não há critérios legais objetivos que permitam quantificar de forma econômica os danos morais sofridos pela parte. Referidas situações dependem da análise individual de cada caso concreto, de modo que se deva aplicar justo valor em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como ao caráter pedagógico e compensatório da medida, sem que resulte no enriquecimento ilícito da vítima.
A indenização moral deve ser fixada, pois, em valor suficiente à reconstrução do constrangimento suportado pela vítima e que seja capaz de impedir que o ofensor se perpetue na prática de atos ilícitos, sem que isso, contudo, se torne uma fonte de enriquecimento indevido. (TJSC, Apelação n. 0300456-90.2015.8.24.0167, do , rel. Desa. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 09-06-2022).
No que se refere ao valor compensatório/punitivo a ser arbitrado àquele que teve seu direito violado, deve-se adotar os mais rigorosos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, na tentativa de se buscar o equilíbrio entre a satisfação correspondente ao prejuízo moral sofrido e o caráter punitivo da medida, a fim de se evitar um enriquecimento injusto do lesado, tampouco a continuidade da prática ofensiva a direito alheio. (TJSC, Apelação n. 5000900-82.2019.8.24.0002, do , rel. Desa. Rejane Andersen, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 31-05-2022).
Deste modo, ao considerar casos semelhantes decididos por este Tribunal e observando os princípios de razoabilidade e proporcionalidade, além da gravidade do dano, conclui-se adequado estabelecer indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A propósito, em caso semelhante ao presente, assim se decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR VÍCIOS CONSTRUTIVOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. NEGAR PROVIMENTO DO RECURSO DA PARTE RÉ.
[...]III. RAZÕES DE DECIDIR: (i) Restou comprovada a existência de vícios construtivos na obra realizada pela parte ré, conforme laudo pericial judicial e demais provas documentais e testemunhais; (ii) A parte autora apresentou documentação suficiente para comprovar os danos materiais, não havendo impugnação específica e eficaz por parte da ré; (iii) Configurado o dano moral em razão da gravidade dos vícios e da necessidade de demolição da obra, mostra-se correta a fixação de dano moral no valor de R$ 10.000,00; (iv) Inviável o acolhimento do pedido reconvencional, diante da constatação de que a obra estava viciada e foi demolida, não sendo possível exigir pagamento por serviços adicionais.[...] (TJSC, Apelação n. 0302716-53.2016.8.24.0023, do , rel. Marcos Fey Probst, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 05-08-2025) (sem destaque no original).
Assim, o valor da indenização por danos morais deve ser minorado para R$ 10.000,00 (dez mil reais).
3 – Ônus de sucumbência
Com a reforma da sentença, a readequação da sucumbência é medida que se impõe.
Já considerada a prestação jurisdicional deste grau de jurisdição, constata-se que a parte autora foi vitoriosa em relação à rescisão contratual, à condenação da ré à restituição dos valores pagos pela parte autora, bem como à condenação ao pagamento de indenização aos danos morais. A parte ré, por sua vez, foi vitoriosa em relação ao afastamento da multa contratual, dos danos materiais e a redução do quantum da condenação aos danos morais.
Desta forma, diante da sucumbência recíproca e conforme a proporção entre vitórias e derrotas, mostra-se adequado condenar as partes ao pagamento das custas processuais, na proporção de 70% pela parte ré e de 30% pela parte autora, nos termos do artigo 86 do CPC, suspensa a exigibilidade com relação à autora por ser beneficiária da justiça gratuita.
Os honorários de sucumbência, em atenção ao Tema 1076/STJ, devem ser fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da condenação (incluídos seus consectários legais), nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC, divididos na mesma proporção das custas.
Anote-se que sobre o resultado não há acréscimo, "pois, ainda que de forma reflexa, a correção monetária e os juros moratórios já incidem no cálculo da condenação ou do proveito econômico, de modo que a determinação de novos juros de mora sobre a parcela dos honorários configuraria bis in idem" (AgInt nos EDcl no REsp n. 2.085.706/SC, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 27/5/2024, DJe de 29/5/2024).
Quanto aos consectários legais, vale anotar que, de fato,
a jurisprudência do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0000634-44.2019.8.24.0015/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
EMENTA
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. VÍCIOS CONSTRUTIVOS GRAVES EM IMÓVEL NOVO. CLÁUSULA PENAL INVERSA. DANO MORAL CONFIGURADO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta por construtora contra sentença que julgou parcialmente procedentes pedidos de rescisão contratual, restituição de valores, multa contratual, indenização por danos materiais (a liquidar) e danos morais, em razão de vícios construtivos em imóvel adquirido pela autora.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão consistem em: (i) saber se os vícios construtivos constatados autorizam a resolução contratual; (ii) verificar a prova dos danos materiais; (iii) definir a aplicabilidade da cláusula penal em favor de instituição financeira ao caso; e (iv) apurar a ocorrência de dano moral e eventual redução do valor fixado.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. Questões que não foram devidamente deduzidas em momento próprio, na inicial ou na contestação, nem foram objeto de análise pela sentença, não podem ser inauguradas em apelação – exceção feita apenas àquelas de ordem pública – porque caracterizam inovação recursal. Assim, não se pode analisar a questão inaugurada somente em recurso, relativa ao pedido subsidiário no sentido de que, em caso de manutenção da sentença, seja fixada taxa de ocupação do imóvel pelo período de fruição do bem.
4. Ausente comprovação suficiente dos danos materiais e de seu nexo de causalidade com os vícios construtivos, inviável a condenação.
5. O Tema 971 do STJ estabelece que, em contratos de adesão entre construtor/incorporador e promitente comprador, a cláusula penal prevista apenas para inadimplemento do adquirente deve ser considerada para fixação de indenização por inadimplemento do vendedor. A situação dos autos não se amolda ao Tema 971 do STJ, pois se trata de contrato de alienação fiduciária celebrado entre o adquirente e a Caixa Econômica Federal, onde a construtora figura apenas como vendedora do bem. A multa contratual foi estipulada exclusivamente em favor da instituição financeira como mecanismo de resguardo ao crédito concedido, não havendo previsão de reciprocidade ou benefício para a construtora.
6. Dano moral configurado pelo longo período de convivência com vícios graves, privação de uso do imóvel e risco à segurança; quantum indenizatório reduzido para R$ 10.000,00, conforme princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
IV. DISPOSITIVO
7. Recurso conhecido em parte e parcialmente provido para afastar a condenação ao pagamento de danos materiais, reduzir a indenização por danos morais e afastar a condenação ao pagamento de multa contratual. Sem honorários recursais em razão da vitória parcial do recurso (Tema 1059/STJ).
Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 85, § 2º, 86 e 373, I; CC, arts. 186, 927 e 944; CDC, arts. 18 e 20.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Tema Repetitivo 971, REsp 1.614.721/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª Seção, j. 22.05.2019; STJ, AgInt no AREsp 1.288.145/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 12.11.2018; TJSC, Apelação n. 5012394-45.2020.8.24.0054, rel. Haidée Denise Grin, 7ª Câmara de Direito Civil, j. 16.11.2023; TJSC, Apelação n. 0002266-59.2013.8.24.0066, rel. Saul Steil, 3ª Câmara de Direito Civil, j. 27.02.2024.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso e nesta, dar-lhe parcial provimento para: a) afastar a condenação a título de danos materiais; b) afastar a condenação ao pagamento da multa contratual; c) minorar o quantum indenizatório, fixando-o em R$ 10.000,00 (dez mil reais); d) condenar as partes ao pagamento das custas processuais, na proporção de 70% (setenta por cento) pela ré e 30% (trinta por cento) pela parte autora; e e) condenar as partes ao pagamento de honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da condenação, divididos na mesma proporção das custas, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 12 de novembro de 2025.
assinado por LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR, Desembargador Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6788686v9 e do código CRC 711ae1b6.
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Signatário (a): LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Data e Hora: 12/11/2025, às 19:30:24
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 18/11/2025
Apelação Nº 0000634-44.2019.8.24.0015/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
PRESIDENTE: Desembargador MARCOS FEY PROBST
PROCURADOR(A): MONIKA PABST
Certifico que este processo foi incluído como item 79 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 12/11/2025 às 16:06.
Certifico que a 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER PARCIALMENTE DO RECURSO E NESTA, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA: A) AFASTAR A CONDENAÇÃO A TÍTULO DE DANOS MATERIAIS; B) AFASTAR A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DA MULTA CONTRATUAL; C) MINORAR O QUANTUM INDENIZATÓRIO, FIXANDO-O EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS); D) CONDENAR AS PARTES AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS, NA PROPORÇÃO DE 70% (SETENTA POR CENTO) PELA RÉ E 30% (TRINTA POR CENTO) PELA PARTE AUTORA; E E) CONDENAR AS PARTES AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM 10% SOBRE O VALOR ATUALIZADO DA CONDENAÇÃO, DIVIDIDOS NA MESMA PROPORÇÃO DAS CUSTAS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Votante: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Votante: Desembargador Substituto GUSTAVO HENRIQUE ARACHESKI
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
CLEIDE BRANDT NUNES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:13:30.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas